Novembro 2023
Cientistas descobrem primeira evidência do uso de imaginação em animais
A capacidade de se transportar para outros locais ou momentos com o pensamento era, até agora, uma capacidade que se acreditava estar reservada aos humanos, mas um grupo de investigadores detetou que os ratos também têm imaginação.
Para alcançar esta descoberta, cientistas do Janelia Research Center do Howard Hughes Medical Institute, na Virgínia (Estados Unidos), desenvolveram uma espécie de “detetor de pensamento”, capaz de medir, em tempo real, a atividade neuronal de ratos e traduzir seu significado, revelou esta quinta-feira este instituto médico.
O sistema combina realidade virtual de 360 graus e uma interface cérebro-máquina (IMC) para sondar os pensamentos internos dos ratos, medindo a atividade elétrica do hipocampo, a região do cérebro onde as memórias são armazenadas e geradas.
Quando o cérebro está a recordar, há uma atividade específica no hipocampo relacionada a essa atividade, mas até agora não tinha sido detetada em animais.
O sistema permitiu aos investigadores verificar como, tal como os humanos, quando os roedores vivenciam locais e eventos, padrões específicos de atividade neuronal são ativados no seu hipocampo.
Os cientistas descobriram, assim, que um rato pode ativar a atividade do hipocampo apenas pensando num lugar, sem se deslocar fisicamente, ou seja, imaginando-o.
Como primeira fase da experiência, os investigadores criaram uma espécie de “dicionário de pensamentos” que lhes permitia descodificar os sinais cerebrais do rato quando este experimentasse alguma coisa.
Realizaram depois dois testes, que foram ‘batizados’ com nomes cinematográficos.
Num destes testes, chamado “Jumper”, em homenagem ao filme e livro cujo protagonista tem a capacidade de se teletransportar, o rato foi introduzido no sistema e enquanto caminhava sobre um cinto esférico, os seus movimentos eram refletidos na tela de 360 graus. Quando alcançou o seu objetivo, foi recompensado.
O sistema registou a atividade do hipocampo do rato e mostrou como os seus neurónios são ativados quando o rato ‘navega’ para atingir o alvo.
O resultado final é que o animal utiliza os seus pensamentos para alcançar a recompensa, pensando primeiro onde precisa de ir para obtê-la, um processo imaginativo que as pessoas vivenciam regularmente.
Na segunda experiência, chamada “Jedi”, em homenagem à saga Star Wars, o rato fica fixado num local virtual e move um objeto para um local apenas pelo pensamento, da mesma forma que alguém sentado pode imaginar a levantar-se para pegar numa chávena de café, sem se mover.
Em seguida, os investigadores mudaram o local alvo, exigindo que o animal produzisse padrões de atividade associados ao novo local.
A equipa descobriu que os ratos podem controlar com precisão e flexibilidade a atividade do hipocampo, assim como os humanos.
Além disso, os animais conseguem manter essa atividade no hipocampo por vários segundos, tempo semelhante ao que os humanos levam para reviver acontecimentos passados ou imaginar novos cenários.
“Imaginar é uma das coisas mais extraordinárias que os humanos podem fazer. Agora descobrimos que os animais também podem fazer isso e encontramos uma maneira de estudá-lo”, realçou um dos investigadores, Albert Lee.
O estudo também mostrou que o sistema de interface cérebro-máquina (IMC) pode ser utilizado para sondar a atividade do hipocampo, o que representa um grande avanço no estudo desta importante região do cérebro.
Outubro 2023
Documentário “Sabem que sou inocente”
“Sabem que sou inocente” é uma grande reportagem de Mafalda Gameiro, com imagem de Paulo Jorge e edição de imagem de José Rui Rodrigues, apresentado no programa “Linha da Frente”, dia 26 de outubro, às 21H na RTP1.
Trata-se de uma grande reportagem sobre animais selvagens em cativeiro, para diversão humana.
Serão os Zoológicos e os Delfinários, espaços adequados para manter animais, cujo habitat natural destas espécies é a selva, a savana ou os oceanos?
Os autores falaram com ex-funcionários de parques, destinados à exposição de animais selvagens, que revelaram os sinais de stress em que algumas espécies se encontram; as evidências do comportamento alterado; a medicação que lhes é administrada para diminuir os níveis de ansiedade.
Falaram também com especialistas, que confirmam as diferenças no comportamento animal, quando estes vivem no habitat natural e em confinamento. Uma vida em clausura gera nas espécies, estados depressivos, compulsivos ou demência. Este conjunto de distúrbios é designado por Zoocose.
Falar de bem-estar animal, é ou não compatível com o enclausuramento de animais selvagens? O documentário lança a pergunta.
Veja o documentário AQUI.
Outubro 2023
Richard O’Barry fala sobre a necessidade de melhorar o bem-estar dos cetáceos em cativeiro
“Existem 35 golfinhos em Portugal. Nenhum pode ser libertado, mas todos podem ser transferidos para habitats mais naturais”
Ativista norte-americano esteve em Portugal a convite da provedora do animal para alertar para a necessidade de melhorar o bem-estar dos cetáceos em cativeiro.
Nos primeiros dez anos da sua carreira, Richard O’Barry trabalhou na indústria dos golfinhos em cativeiro. Durante a década de 1960, empregado pelo Miami Seaquarium, o norte-americano natural da Flórida ajudou a capturar e a treinar dezenas de animais. A sua reputação era tal, que foi o escolhido para treinar os cinco golfinhos que davam vida a Flipper, a personagem da série com o mesmo nome exibida pela NBC entre 1964 e 1967.
Tudo mudou em 1970. Kathy, uma das cinco fémeas que davam vida a Flipper, morreu nos seus braços. “Fiquei tão zangado, porque ela não tinha de morrer”, recorda. “Aprendi imenso. E quando se aprende estas coisas e não se faz nada, não se consegue dormir à noite.”
Nas últimas cinco décadas resgatou e reabilitou golfinhos por todo o mundo. Fundou a Dolphin Project, que está por detrás do primeiro e único santuário para golfinhos (a funcionar na Indonésia). Protagonizando o documentário The Cove (vencedor do Óscar de melhor documentário), denunciou como a chacina cometida na caça anual em Taiji, no Japão, é o “grau zero” da indústria dos golfinhos em cativeiro.
Hoje, aos 82 anos, continua a ser um ativista e uma voz ativa em campanhas contra o cativeiro e caça destes animais em todo o mundo. É neste contexto que esteve em Portugal, a convite da Provedora do Animal, para participar num evento de consciencialização.
“PARA OS GOLFINHOS, O CATIVEIRO É MAIS STRESSANTE DO QUE PARA QUALQUER OUTRO ANIMAL”
Imagine ir para um quarto num hotel de luxo, mas ter de ficar neste espaço de poucos metros para o resto da vida. Por muito boas que as condições fossem, a certa altura ia querer sair dali.
Para os cetáceos, esta é a realidade de viver num tanque, denuncia Richard O’Barry. “Para os golfinhos, viver em cativeiro é mais stressante do que para qualquer outro animal. É o único animal em todo o zoo que tem de fazer truques em troca de comida. Os únicos que vivem num estádio, como gladiadores.”
Na natureza, um golfinho pode nadar entre 40 a 200 quilómetros por dia, atingir velocidades de 50 quilómetros por hora e mergulhar a profundidades entre 500 e 1000 metros. Em Portugal, o maior tanque é o do Jardim Zoológico de Lisboa. Tem 400 metros quadrados.
Estamos a falar do animal mais inteligente dos oceanos, que pode viver até aos 50 anos. É um animal que tem características muito especiais de ser senciente (isto é, sente como nós, sente perda e dor, tem medo). Têm laços familiares extremamente próximos e trabalham em conjunto com a sua comunidade, [por exemplo para] caçar”, explica a Provedora do Animal.
Tudo isto se torna impossível em cativeiro e leva Laurentina Pedroso a defender que é urgente melhorar o bem estar destes animais. “Se há uns anos aquilo que moveu muitas pessoas a questionar isto eram motivos éticos, hoje os motivos pelos quais nós não devemos continuar a manter os animais nestas circunstâncias são baseados na ciência. Nós temos conhecimento [científico que mostra] que não é bom para o bem-estar destas espécies serem mantidos da forma em que estão.”
“NÃO CHEGA PARAR COM OS ESPETÁCULOS” SE NÃO EXISTEM SOLUÇÕES CRIADAS
Segundo a World Animal Protection, existem cerca de três mil golfinhos em cativeiro em todo o mundo. Na União Europeia, os números mais recentes dão conta de 308 animais em 34 delfinários espalhados por 14 países. Portugal tem 35 golfinhos-roazes (a espécie mais comum), 27 no Zoomarine e 8 no Jardim Zoológico de Lisboa.
A lei europeia já oferece alguma proteção contra a captura e exportação destas espécies. E há até países que já tomaram medidas para fasear o fim das espécies em cativeiro. França e Canadá, por exemplo, proibiram os espetáculos, mas isto, argumenta Laurentina Pedroso, não é suficiente.
É preciso pensar em soluções para os animais já em cativeiro, em vez de assumir que permaneceram nestas condições até ao final das suas vidas (que no caso dos golfinhos pode chegar aos 50 anos). Só que isto é complexo. “Existem 35 golfinhos em Portugal. Nenhum pode ser libertado, mas todos os animais podem ser transferidos para habitats mais naturais. Podemos melhorar a sua qualidade de vida”, afirma Richard O’Barry.
A solução proposta pela Provedora do Animal passa pela criação de verdadeiros santuários, zonas protegidas no mar que permitem “ter o animal em situações próximas daquilo que é o seu habitat natural”.
“Estes animais não podem ser introduzidos de uma forma ligeira, porque muitos deles já nasceram em cativeiro. Não sabem caçar, estão habituados a comer peixe morto. Estão dependentes dos seus treinadores. Colocá-los num lugar aberto no mar não é possível. Então, estes santuários são estruturas transitórias para alguns animais, que poderão reunir condições mais tarde para serem libertados ou criar condições para aqueles que não têm possibilidade de voltar ao seu habitat.”
Laurentina Pedroso defende a proibição da reprodução em cativeiro (para não prolongar mais o problema), da entrada e saída de animais do país e das interações (programas que permitam tirar fotos, fazer festas ou nadar com golfinhos e que exigem que o comportamento deste “animal selvagem” tenha de ser condicionado pelo treino).
Por outro lado, defende a “modernização do conceito de espetáculo para que o animal possa ser exibido, respeitando melhor as suas regras de bem-estar animal”. Isto pode passar por privilegiar exibições em que os animais são mostrados nos seus comportamentos quotidianos (a nadar, a comer) como já acontece com outros animais. E com pequenas adaptações, como deixar de ter colunas de som nos espetáculos em prol de sistemas com auscultadores (como nos museus), uma vez que os golfinhos têm um sistema auditivo dez vezes superior ao humano que faz com que sons altos sejam perturbadores.
Portugal tem a oportunidade de ser pioneiro, acreditam. “Com a costa que temos, nós podemos liderar a criação destas infraestruturas. Podemos depois fazer a transição dos animais que nós temos nestes locais para essas infraestruturas e quiçá receber de outros países da Europa.”
Pode ler o artigo completo de Cláudia Monarca Almeida, para o Expresso online em 20/10/2023